Arquivo do mês: setembro 2010

Jornal do CAHIS n.º 1

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E, sim, este é o número “1”, pois o anterior foi o número “0”.

Esperamos que gostem!

C.A. de História – UFU.

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11 de Setembro – Protesto & Som

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“Prendam Carmen e Esmeralda!”

Os ciganos representam uma das comunidades mais inofensivas e pacíficas do mundo. Pela sua fragilidade material e política, têm sido o bode expiatório perfeito do racismo e do neofascismo. Por José Steinsleger, La Jornada

Artigo | 4 Setembro, 2010 – 13:07

Ilustração para a ópera CarmenIlustração para a ópera Carmen

Para o governo de França (país berço dos direitos do cidadão e do racismo científico), o errar pelo mundo sem emprego fixo dos ciganos (ou povo rom) equivale, uma vez mais, a se levar a liberdade demasiado a sério. Mas os ciganos começaram a vaguear (e não pela própria vontade) quando a França não existia como nação.

Sem uma cultura escrita que tenha esclarecido as suas origens com precisão, os povos rom têm mil anos carregando de um lado para outro os seus pertences, e com o que mais lhes pesa: o clima de medos e preconceitos que todas as sociedades, religiões, culturas e regimes políticos têm deles guardado.

Os historiadores consagrados apenas os nomearam. No estudo inquietante do mundo mediterrâneo na época de Felipe II (1800 páginas), Fernando Braudel dedica-lhes, em pé de página, uma só linha em que diz: “…do tratamento dado aos ciganos espanhóis enviados às galeras, não por causa de um delito, mas por causa da necessidade de que houvesse pessoas para remar”.

De acordo com os preconceitos da época, Cervantes narrou a história de um amor entre Preciosa e um jovem da nobreza que decide comprar a criança, raptada e criada por uma velha cigana cheia de malícia. E Shakespeare, mais indulgente, introduziu os ciganos em cinco das suas obras: Caliban, Como Gostais, Romeu e Julieta, António e Cleopatra e Otelo.

No início do século XIX, quando no bairro Sacromonte, em Granada, os ciganos andaluzes começaram a difundir a arte flamenca ou cigano-andaluza que vinham aperfeiçoando desde o século XV, produziu-se um sobressalto. Fusão da voz com a guitarra e o corpo que, anos depois, consagrariam o par de mulheres mais famosas da cultura cigana: Esmeralda e Carmem, mulheres lendárias.

Esmeralda (Victor Hugo, Nossa Senhora de Paris, 1831) e Carmen (Prosper Merimée, 1845), foram algo mais que simples personagens lendárias na literatura romântica. Foram uma explosão: a revelação do que as mulheres almejavam para si, faiscando engenho, sempre rendendo os homens e a vida que, acima de tudo, amam a liberdade.

Sensualidade recôndita

Santa Joana intuiu, no seu favorito e estranho poema Primeiro sonho, e que a gramática masculina da Real Academia castigou com a definição de ciganada ou ciganear: enganos com os quais só se pode conseguir o que se deseja.

No fundo, o desejo de liberdade que José Martí entendeu assim: “Deixam na memória os ciganos as cores de um sonho brilhante… Como que persegue o cigano sem consciência um ideal que não há de encontrar jamais” (Entre flamencos, 1883).

Em El amor brujo (ballet, 1925), e Bodas de sangre (teatro, 1933), os andaluzes Manuel de Falla e Federico García Lorca sublimaram a tragédia dos ciganos. Tia Añica la Piñaraca, famosa cantora andaluza, dizia, de sua arte: quando canto com gosto, sai sangue de minha boca.

Temidos, expulsos, explorados, escravizados, marginalizados, dispersos pelo mundo, os povos rom souberam conservar a sua cultura e uma férrea tradição de hábitos e costumes que, para sobreviver, não podiam senão ser muito conservadores.

Apesar das duríssimas condições de vida, os ciganos deram ao mundo personagens famosos: actores (Charles Chaplin, Yul Brynner, Michael Caine); guitarristas de jazz, rock e flamenco (Django Reinhardt, Ron Wood, Camarón de la Isla, Tomatito), bailarinas (Carmen Anaya); baladistas (Sandro, Diego el Cigala), Augusto Krogh (prémio Nobel de Medicina, 1920). Até Bill Clinton se jacta de ser sobrinho tataraneto de Charles Blythe, rei dos ciganos da Escócia (1847)!

Alguns estudiosos associam o povo cigano ao povo judeu. No entanto, os ciganos não se regem por livros sagrados, não reclamam territórios, não defendem o nacionalismo e tampouco formaram grandes grupos financeiros.

Os ciganos representam uma das comunidades mais inofensivas e pacíficas do mundo, e os seus ideais figuram na bandeira que adoptaram em 1971: azul em cima (o céu do país que os recebe), verde abaixo (o território em que pisam), e uma roda no meio, que simboliza o nome de seu hino: Guedem, guedem (andai, andai).

Pela sua fragilidade material e política, os povos rom têm sido o bode expiatório perfeito do racismo e do neofascismo que os governantes da União Europeia encarnam, hoje, como Silvio Berlusconi e Nicolas Sarkozy. Ou personagens como a inglesa Viviane Reding, que preside a Comissão para Justiça e os Direitos Fundamentais dos Cidadãos Europeus (sic).

Em Abril passado, a senhora Redign qualificou de inaceitáveis as discriminações sofridas por essa minoria étnica (que não se dignou a nomear). Depois (muito british, ela), rectificou, dizendo que não estava a favor nem contra as propostas francesas. Ou seja, a expulsão dos ciganos do país da tolerância.

Nada de novo. Os reis Luis XII (1504), Francisco I (1538) e Carlos IX (1560) expulsaram os ciganos de França, e no início da Segunda Guerra Mundial o regime de Vichy seguiu com a tradição. Prendeu 30 mil ciganos e entregou 15 mil aos nazis que acabaram nos fornos dos crematórios.

John Steinsleger é jornalista e escritor argentino e tem uma coluna no La Jornada

Tradução: Katarina Peixoto para a Carta Maior

Disponível em: http://www.esquerda.net/artigo/%E2%80%9Cprendam-carmen-e-esmeralda%E2%80%9D

Acesso em: 05/09/2010.

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